Aquele sentimento que é a plenitude da beleza, que completa totalmente a alma. Ápice do deleite.
Além da felicidade, apogeu. Íntimo, único e lírico. Máximo, lépido e épico. Eu quero.

sábado, 20 de setembro de 2014

O paradoxo B - tentativa frustrada de aclarar o algaraviado

"Escreve com um pseudônimo e publica", ele me disse frente à impublicabilidade das minhas histórias. O desafio era me despedaçar aos poucos ao escrever com essa máscara, que, na realidade, serviria para colocar para fora minha essência, aquela tão verdadeira que chega a ser impublicável. Foi aí que surgiu o "paradoxo B". 

Primeiro, deixa eu contextualizar. Eu sou eternamente apaixonada pelo poeta, aqui representando qualquer criatura que possua o dom de se expressar, ou como dizem, que entenda os paranauês da alma. As palavras me afetam mais que um carinho na nuca, quando eu leio algo que me abala de verdade, eu perco o meu chão. É que eu sou intensa.

Bom, ele escreve. E eu lia ele. Ele entrava fundo na minha alma enquanto ia formando as frases fatais daqueles textos, sem nem imaginar a possibilidade da minha existência. Ele era uma das coisas que acendia os pedacinhos de intensidade do meu interior com as suas expressões. Ele era uma coisa, um ente.

Mas um dia, até hoje ainda não entendi como, a entidade virou pessoa, virou conversa, virou conexão. Eu tive que começar a lidar diretamente com a criatura que me dava labirintite. Do nada, mesmo, eu tava tentando me expressar para aquela entidade expressante que jogava expressões no ar e elas caiam dentro de mim com um peso matador. Ele virou um "ele", virou alguém. Eu tava tendo conversas com aquela cabeça, com aquela mente e com aquele coração, os mesmos que descreviam um mundo que eu já via um pouco como meu.

Um dia, tentando explicar, eu disse, meio ingênua: "Tu escreve muito bem. Eu poderia dizer que as tuas palavras me tocam. Mas o que eu sinto é um pouco mais que isso. É como se eu bebesse tuas palavras e fosse contaminada e elas tivessem correndo ou passeando dentro do meu sangue. Eu sinto um pouco mais que um toque. Eu sinto uma infecção. Porque, eu como leitora, sentei e escolhi ler o texto como se tu tivesse falando comigo. E falou." 

De repente eu comecei a me expressar, a me abrir, a buscar alguma forma de coexistir com essa entidade como se fosse uma pessoa qualquer. E, aparentemente, ele é uma pessoa qualquer. Ele fala gírias, ele tem um olhar que dá vontade de mergulhar dentro e ele me manda ler bula de remédio tarja preta, quando se cansa de mim. 

A partir daí as coisas aqui dentro começaram a dançar, para cima e para baixo, vários lugares acendiam e apagavam. Os pés batiam no chão enquanto a mente me dava ainda mais dor de cabeça. A labirintite adquiriu novos sintomas, acabou virando um caso para o doutor House. É que eu sou intensa.

Ele me assusta enquanto os registros dele me inspiram. Me desafia a escrever um texto, para que o façamos juntos. E então, eu defino o paradoxo:

Como qualquer palavra que eu possa digitar aqui vai ser boa o suficiente para a imensidão que é a escrita dentro dele? Como vou me abrir completamente em um texto com pseudônimo, enquanto a banda que ele me mostrou é a trilha sonora dos pensamentos mais cabeludos e incompreensíveis da minha cabeça nos últimos dias? Como me despedaçar inteira em forma de texto enquanto os olhos profundos me dizem que tudo não passa de hormônios e neurônios?

Como tornar publicável o espectro sutil e sui generis do encontro do escritor com a leitora, da palavra com a retina?

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